9 de jan. de 2015

Ética e liberdade expressão

“É de fundamental importância garantir a liberdade de expressão que permita a informação livre, sem coações de ordem política, econômica, ideológica e religiosa[1]. A liberdade é um direito de todos e, por isso, também um grande desafio ético nas diversas esferas da sociedade. Ela é em primeiro lugar expressão da dignidade humana. A liberdade é um direito fundamental, mas igualmente inclui a dimensão da responsabilidade do ser humano em relação a si próprio e ao outro, ou seja, trata-se da responsabilidade pelo bem estar pessoal e bem estar comum. O princípio universal que estabelece a liberdade de expressão no convívio humano é um bem precioso. A adoção desse princípio garante a condição indispensável para a construção de uma sociedade que tenha na paz, na justiça e no bom relacionamento sua principal meta política. As mídias têm um papel destacado na missão de informar e denunciar os desmandos sociais, permanecendo livres de coerções e de qualquer tipo de censura[2].

Em nível internacional, a liberdade de expressão está garantida pelo artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948: “Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”[3].
No Brasil, a liberdade de expressão está assegurada na Constituição Federal, capítulo I, dos Direitos e Deveres individuais e coletivos, como segue:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vidaliberdadeigualdadesegurança e a propriedade, nos termos seguintes:
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença
Art. 220 A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
§ 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

Uma sociedade que se estrutura a partir da centralidade do ser humano prima pelos espaços de liberdade garantidas ao ser humano, mas sempre em profunda relação da responsabilidade e deveres que a ela correspondem. “A primazia da verdade abriu caminho para a primazia da liberdade de expressão, entendida como a possibilidade absoluta de expressar nos meios de tudo aquilo que se pensa sem passar pelo filtro da razão[4]”. Mas devemos sempre estar cientes de que “nenhuma liberdade, nem sequer a liberdade de expressão é absoluta: com efeito, ela encontra o seu limite no dever de respeitar a dignidade e a legítima liberdade do próximo”[5].
No contexto da comunicação, está na base o cidadão ser informado de forma correta e completa tanto quando isto é possível. É preciso informar sobre a informação, ou seja, deixar claro que nem sempre se dispõe sobre a verdade completa de um fato. “Não há engano público quando não há negligência culpável e há disposição em retificar”[6]. A verdade pode ser resultado de uma busca prolongada, muitas vezes através de averiguações técnicas (policiais) que independem da emissora de notícias. Mas nunca, ainda que ela não é conhecida, se pode abdicar da veracidade que “diz respeito ao que conhecemos, que pode ser mais ou menos acertado. É adequado informar o que se sabe”[7] e deixar a questão aberta para ser completada oportunamente.
Qualquer seja a qualidade das comunicações, elas incidem sobre a educação do povo. Os meios de comunicação podem informar ou desinformar, dependendo de suas propostas. Os meios de comunicação que prezam pela qualidade da informação, que resulta objetividade e do conhecimento, potencializam os processos de educação de uma coletividade. Hoje os diversos meios de comunicação – as novas mídias – Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) são utilizados amplamente pelas instituições de educação formal acadêmica. O modelo tradicional de educação não se sustenta na sociedade atual. Embora, segundo as condições socioeconômicas de cada lugar, os meios de comunicação sejam utilizados de forma diferenciada, de alguma forma estão presentes como importantes meios pedagógicos e como meios de aquisição de novos conhecimentos. As próprias mídias são instâncias de educação ampla e continuada, o que permite aos cidadãos acompanhar o compasso do desenvolvimento de sua própria sociedade. Os modelos de educação, em parte já no presente, e mais seguramente no futuro, terão como suporte principal as diversas formas de comunicação.
Mediante tão significativa incidência dos meios de comunicação na sociedade, ressalta-se aqui, portanto, a importância de formação acadêmica profissional adequada dos profissionais de comunicação. O conhecimento, o compromisso com a verdade, o exercício da profissão pautado na ética profissional são fatores determinantes para os meios de comunicação.
O caráter educativo dos meios de comunicação abrange todas as áreas de programação, documentários, filmes humor ... A educação pode e deve ser abordada de diversas formas até porque não se reduz a aquisição de novos conhecimentos. Ela implica em valores humanos relacionados à própria pessoa, mas também ao ambiente onde vive. As diversas áreas da comunicação são, portanto, igualmente potencialmente educativas e requerem respeito à dignidade da pessoa, à sua privacidade de imagem e dados, direitos autorais, a informações corretas sobre sua pessoa, sua atividade e sua expressão, etc. ... Os meios de comunicação sérios e responsáveis não abrem mão de uma ética própria, mesmo que as tendências apontem para uma total desordem nesta área em virtude do amplo acesso às diferentes mídias e à possibilidade de aparente anonimato Igualmente a corrida pela velocidade e o inédito não podem ser armadilhas para a falta de ética e superficialidade.
 A liberdade de expressão, portanto, não é absoluta e se dá no contorno das expressões de dignidade da pessoa e da coletividade. O direito de ser informado e o dever de informar não pode ser satisfeito às custas de invasão de privacidade, do direito à imagem e à preservação de dados pessoais.



[1] CNBB, Diretório de Comunicação, 2014, n. 114.
[2] CNBB, Diretório de Comunicação, 2014, n. 198.
[3] DECLARAÇÃO Universal dos Direitos Humanos, 10 dez. 1948. Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm. Acesso em: 15 jun. 2014.
[4] ECHANZ; PAGOLA, 2007, p. 73.
[5] JOÃO PAULO II aos jornalistas, Grande Jubileu 2000. Disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/speeches/documents/hf_jp-ii_spe_20000604_journalists_po.html. Acesso em: 10 jul. 2014.
[6] ECHANZ; PAGOLA, 2007, p. 74.
[7] Cf. ECHANZ; PAGOLA, 2007, p. 74.

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