28 de abr. de 2015

IGREJA EM SAÍDA PARA SERVIR - Campanha da Fraternidade 2015.


A Campanha da Fraternidade 2015 abre um grande leque onde a Igreja é chamada a servir. Serviço que compreende pequenos gestos de atenção aos irmãos, de ordem pessoal ou integrado em alguma organização, como as Pastorais Sociais, mas também um engajamento efetivo nas diversas esferas sociais e políticas que visem o bem comum e garantam o respeito à dignidade das pessoas e da “casa comum” – o ambiente - onde vivem. Desta forma, a Igreja – Povo de Deus, testemunha, com autenticidade, a mensagem do Evangelho.  “Eu vim para servir” (Cf. Mt 10, 45). Este lema vem alinhado ao atual momento de toda a Igreja. Desde sua primeira aparição em público, o Papa Francisco tem assinalado para uma Igreja que assuma características sempre mais consistentes, segundo o Concílio Vaticano II. Uma Igreja pobre, uma Igreja não seja tranquila, este é o desejo e também contribuição do Papa Francisco.  Trata-se, portanto, de uma Igreja com raízes bem sólidas na fé cristã nascente e com uma abertura incondicional às realidades humanas hoje. Ou seja: Uma Igreja congregada em torno da Eucaristia e de serviço aos irmãos.

Uma Igreja solidária, servidora e missionária!


A Igreja é, por natureza, missionária! Em Aparecida, os Bispos afirmaram a Igreja essencialmente missionária, que vai ao encontro de cada pessoa (DAp n. 548): “Não podemos ficar tranquilos em espera passiva em nossos templos”. Esta constatação inquietante resulta da percepção dos sinais dos tempos em nosso Continente e do propósito de dar uma resposta efetiva ao sair de qualquer forma de conforto e comodismo para ajudar os irmãos na fé e todo o gênero humano (DAp n. 548):   

"É urgente ir em todas as direções para proclamar que o mal e a morte não têm a última palavra, que o amor é mais forte, que fomos libertos e salvos pela vitória pascal do Senhor da história, que Ele nos convoca em Igreja, e quer multiplicar o número de seus discípulos na construção do seu Reino em nosso Continente!"

 Esta Igreja solidária, servidora e missionária, de que fala o Hino da Campanha, é possível se as comunidades – e cada cristão - se abrirem para a renovação em diversas esferas e se decidam de forma renovada e aprofundada por Cristo. A grande renovação de toda a Igreja, como vem sendo anunciada, não se reduz a algumas mudanças estruturais. A renovação é antes de tudo conversão particular e comunitária, é colocar Cristo, o Ressuscitado, no centro e permitir e, a partir dele e com ele, sair de si mesmo para ir ao encontro do outro.  Faz-se necessário uma conversão ampla e consistente (DAp n. 370): “A conversão pastoral de nossas comunidades exige que se vá além de uma pastoral de mera conservação para uma pastoral decididamente missionária”.
A renovação anunciada e desejada pelo Papa Francisco está pautada na eclesiologia do Concílio Vaticano II, ou seja, é a retomada da fé autêntica das primeiras comunidades cristãs, a reconciliação com a história, com tantos desvios e desalinhamentos com a comunidade cristã nascente. Neste sentido, renovar é acolher a ação do Espírito Santo, a vontade de Deus, no decorrer da história. É permitir que nas raízes bem firmes no chão da fé cristã, nasça uma nova árvore para cada tempo e lugar.  É também a compreensão de que a missão faz parte da adesão a Cristo. Ser missionário não é privilégio e competência de alguns cristãos, mas faz parte da pertença à comunidade cristã.
Cada discípulo missionário, no seu ambiente, é chamado a edificar o Reino. “O Espírito Santo fortalece a identidade do discípulo e desperta nele a decidida vontade de anunciar com audácia aos demais o que tem escutado e vivido” (DAp n. 251). Mais uma vez voltamos à centralidade da fé cristã, Cristo, Cristo na Eucaristia. É na Eucaristia que os missionários se alimentam e fortalecem para a missão (DAp n. 251):

"A Eucaristia, fonte inesgotável da vocação cristã é, ao mesmo tempo, fonte inextinguível do impulso missionário. Aí, o Espírito Santo fortalece a identidade do discípulo e desperta nele a decidida vontade de anunciar com audácia aos demais o que tem escutado e vivido".

Aparecida diz que cada cristão é discípulo missionário e este (DAp n. 147) “há de ser um homem ou uma mulher que torna visível o amor misericordioso do Pai, especialmente para com os pobres e pecadores”. É para eles que o discípulo missionário é enviado. Sobre esta questão, o Papa Francisco afirma (EG n. 49):

"Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida".

Se aqui se refere como maior inquietude o exercício da caridade, basta olhar para o Evangelho e perceber quanto Jesus foi aquele que foi ao encontro, se inclinou diante do necessitado, especialmente dos mais vulneráveis da época. Assim não podemos afirmar a fidelidade ao Evangelho, senão pelo profundo amor ao próximo. Desde Aparecida, a Igreja local se propõe a edificar uma Igreja em estado de missão (Cf. DAp 213). O desafio para tal é a resposta de cada cristão para sair de si e ir ao encontro. O anúncio mais elementar do Evangelho é a pregação através da caridade, uma caridade que implica num verdadeiro encontro com o outro, a autêntica caridade desejada por Cristo. A caridade que promove a dignidade do outro (EG n. 180):  

"E a nossa resposta de amor também não deveria ser entendida como uma mera soma de pequenos gestos pessoais a favor de alguns indivíduos necessitados, o que poderia constituir uma «caridade por receita», uma série de ações destinadas apenas a tranquilizar a própria consciência".

Não se trata de desmerecer os milhões de gestos de caridade que se realizam mundo afora, mas de compreender que a ação dos cristãos, dos discípulos missionários, tem de ser mais incisiva na sociedade como decorrência da fé.  O Papa continua (EG n. 180):

"A proposta é o Reino de Deus (cf. Lc 4, 43); trata-se de amar a Deus, que reina no mundo. Na medida em que Ele conseguir reinar entre nós, a vida social será um espaço de fraternidade, de justiça, de paz, de dignidade para todos. Por isso, tanto o anúncio como a experiência cristã tendem a provocar consequências sociais".

A proposta do Reino é exigente! Faz-se necessário um engajamento mais intenso e abrangente do discípulo missionário. Ele deve alcançar todas as esferas da sociedade. Mas o cristão que ainda não conseguiu realizar uma experiência profunda de relação pessoal com Deus, ainda não aderiu incondicionalmente a Cristo, tem dificuldades de abraçar a causa missionária. Ele pode estar mais preocupado com suas coisas, seu tempo, ou seja, tende a viver de forma egoísta a sua fé, a vê-la apenas como uma espécie de remédio para os momentos difíceis – as causas urgentes. Segue o Papa (EG n. 81): “Quando mais precisamos dum dinamismo missionário que leve sal e luz ao mundo, muitos leigos temem que alguém os convide a realizar alguma tarefa apostólica e procuram fugir de qualquer compromisso que lhes possa roubar o tempo livre”. A nossa abertura deve ser, por isso, constante, pois as coisas do mundo são atraentes e facilmente nos desviam do nosso serviço no Reino de Deus.   
O discípulo missionário é convidado a dar testemunho a partir de suas experiências de fé.  Ele é decorrência da própria fé. Daí a importância, a ser ressaltada mais uma vez, de fazer a experiência profunda com Deus. O testemunho é fundamental para que a Boa Nova seja acolhida. A este respeito, São João Paulo II diz (RM n. 42):

"O homem contemporâneo acredita mais nas testemunhas do que nos mestres, mais na experiência do que na doutrina, mais na vida e nos factos do que nas teorias. O testemunho da vida cristã é a primeira e insubstituível forma de missão: Cristo, cuja missão nós continuamos, é a « testemunha » por excelência (Ap 1, 5; 3, 14) e o modelo do testemunho cristão. O Espírito Santo acompanha o caminho da Igreja, associando-a ao testemunho que Ele próprio dá de Cristo (cf. Jo 15, 26-27)".

Cabe aqui questionar-se sobre os elementos essenciais da fé cristã.  A nossa profissão de fé implica uma ação efetiva em favor dos irmãos. Deus é nosso Pai e, pela Encarnação do Filho, elevou cada filho seu a uma dignidade ímpar, que requer um especial cuidado por parte de toda a Família Humana, especialmente àqueles que assumiram um compromisso social fundado na fé cristã.  Dizem os bispos em Aparecida (DAp n. 55):

"A ênfase na experiência pessoal e no vivencial nos leva a considerar o testemunho como componente chave na vivência da fé. Os fatos são valorizados quando são significativos para a pessoa. Na linguagem testemunhal podemos encontrar um ponto de contato com as pessoas que compõem a sociedade e delas entre si".

Nós devemos dar testemunho do Mandamento do Amor. Não há outra forma de testemunhar a fé em Deus e sua presença no mundo. O anúncio não pode prescindir do testemunho, testemunho do amor misericordioso de Deus. Podemos fazê-lo de diversas formas, mas a essência nasce no coração do Evangelho. Os bispos ensinam a este respeito (DAp n. 138):

"Amem-se uns aos outros, como eu os amei” (Jo 15,12). Este amor, com a medida de Jesus, com total dom de si, além de ser o diferencial de cada cristão, não pode deixar de ser a característica de sua Igreja, comunidade discípula de Cristo, cujo testemunho de caridade fraterna será o primeiro e principal anúncio: “Todos reconhecerão que sois meus discípulos” (Jo 13,35)".

Podemos concluir este pensamento com as palavras do Papa Francisco (Mensagem para a Campanha da Fraternidade 2015): “Quando Jesus nos diz 'Eu vim para servir', no ensina aquilo que resume a identidade do cristão: amar servindo”.

Igreja em estado de missão: O anúncio do Evangelho.


Segundo o teólogo Norbert Mette (2005, p. 79), “a Igreja não veio para outra coisa senão para anunciar o Evangelho a todas as pessoas”. A consciência desta incumbência divina – a própria razão de ser da Igreja – é importante para se edificar uma Igreja na concepção do Vaticano II sem risco de transformá-la numa ONG ou qualquer outra forma de instituição social. Toda ação solidária deve nascer do coração do Evangelho e remeter-se aos valores evangélicos em todos os tempos e lugares.
O Papa Francisco, na exortação apostólica Evangelii Gaudium (cf. EG n. 84), apela para a superação de um “pessimismo estéril”. A mensagem salvífica é de alegria e esperança (EG n. 84): “A alegria do Evangelho é tal que nada e ninguém no-la poderá tirar (cf. Jo 16, 22). Os males do nosso mundo – e os da Igreja – não deveriam servir como desculpa para reduzir a nossa entrega e o nosso ardor. Vejamo-los como desafios para crescer”.  O discípulo missionário deve anunciar e acolher a Boa Nova do amor e misericórdia de Deus, com alegria e esperança. Segundo a Evangelium Gaudium (EG n. 14),

"os cristãos têm o dever de o anunciar, sem excluir ninguém, e não como quem impõe uma nova obrigação, mas como quem partilha uma alegria, indica um horizonte estupendo, oferece um banquete apetecível. A Igreja não cresce por proselitismo, mas «por atração»".

O Evangelho da alegria e esperança deve chegar com sua mensagem inclusiva à sociedade de exclusão. Jesus não fazia acepção de pessoa, ele se aproxima do pecador, ele sabe quem precisa de conversão.  Conforme a Evangelii Gaudium (EG n. 177), “o querigma possui um conteúdo inevitavelmente social: no próprio coração do Evangelho, aparece a vida comunitária e o compromisso com os outros. O conteúdo do primeiro anúncio tem uma repercussão moral imediata, cujo centro é a caridade”. O anúncio da Boa Nova tem consequências próprias de quem acolhe a Palavra.
Algumas condições intra- e extraeclesiais tornam o anúncio ainda mais desafiador. Vivemos numa sociedade extremamente egoísta. Egoísmo que se estende também às relações com o transcendente. O imediatismo, o relativismo e a vantagem própria se sobrepõe muitas vezes à autenticidade da fé e do anúncio. Nossa educação e nosso modo de interagir através dos modernos meios de comunicação contribuem para que se acentue este egoísmo e distanciamento entre as pessoas. Também as comunidades cristãs, como partícipes da sociedade em geral, apresentam de alguma forma as mesmas características, inclusive em grupos de maior engajamento. Por isso, este apelo para a Igreja de hoje: Cada um e a Igreja como um todo, devem sair de si mesmo. De acordo com o Papa Francisco (EG n. 87), “sair de si mesmo para se unir aos outros faz bem. Fechar-se em si mesmo é provar o veneno amargo da com a imanência, e a humanidade perderá com cada opção egoísta que fizermos”. A busca por alguma espiritualidade é muitas vezes fuga de compromisso cristão, reduz-se ao conforto e consolo pessoal. O Papa Francisco afirma (EG n. 263): “Há o risco de que alguns momentos de oração se tornem uma desculpa para evitar de dedicar a vida à missão, porque a privatização do estilo de vida pode levar os cristãos a refugiarem-se nalguma falsa espiritualidade”.  O conforto de atividades intraeclesiais, onde geralmente se encontra conforto e apoio imediato não pode esgotar nosso campo de atuação. As exigências são tanto maiores quanto mais avançarmos para o mar revolto dos desafios, com os quais nos deparamos quando deixamos o comodismo de lado e ousamos dar mais para o Reino. Neste sentido, alerta o Papa Francisco (EG n. 49):

"Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa proteção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: «Dai-lhes vós mesmos de comer» (Mc 6, 37)".

O discípulo missionário precisa estar ciente de seu chamado para ajudar a levar a Boa Nova, mas também dos limites que tem para anunciar aquele que é maior que ele, aquele que é mistério. Só assim, ele permanece humilde e procura crescer na sua própria fé para pode anunciar (EG n. 45):

"O compromisso evangelizador se move por entre as limitações da linguagem e das circunstâncias. Procura comunicar cada vez melhor a verdade do Evangelho num contexto determinado, sem renunciar à verdade, ao bem e à luz que pode dar quando a perfeição não é possível. Um coração missionário está consciente destas limitações, fazendo-se «fraco com os fracos (...) e tudo para todos» (1 Cor 9, 22).  Nunca se fecha, nunca se refugia nas próprias seguranças, nunca opta pela rigidez auto-defensiva".

O anúncio a partir da fé cristã precisa trazer as características desta, ou seja, se realizar na humildade e na abertura para o Espírito. Todos somos pecadores, frágeis, passíveis de incorrer em erros. O nosso conhecimento no campo da fé pode carecer de aprofundamento, a compreensão do conteúdo do Evangelho se dá de forma progressiva, portanto, sempre há um novo estágio a alcançar. Isto tudo requer uma atitude de muita humildade e ousadia no anúncio. O discípulo missionário, segundo o Papa Francisco (EG n. 45), “sabe que ele mesmo deve crescer na compreensão do Evangelho e no discernimento das sendas do Espírito, e assim não renuncia ao bem possível, ainda que corra o risco de sujar-se com a lama da estrada”. O caminho do Evangelho é o caminho da caridade, do amor ao próximo. Conforme o Papa Francisco (EG n. 9), “quem deseja viver com dignidade e em plenitude, não tem outro caminho senão reconhecer o outro e buscar o seu bem”.

Os novos areópagos da evangelização.


O foco da Campanha da Fraternidade 2015 (CF 2015) está na presença significativa da Igreja na sociedade. O desafio é ser esta presença num país que é laico, sem mesmo estar muito claro, em vastos campos da política e da sociedade em geral, o que isso efetivamente significa. A Igreja, que sempre participou de momentos importantes ou da vida cotidiana dos cidadãos, não pode abdicar da missão que tem, entendendo-se dentro de um complexo sistema sociopolítico plural, a serviço de todo o gênero humano. Os novos areópagos de que a Igreja fala são as diferentes esferas onde a Igreja pode contribuir, como vem fazendo desde o começo de sua história, porém, num modo compatível com as demandas hoje.
Na contramão da mensagem do Evangelho, vive-se tempo conturbado onde o ser humano está cada vez mais desprovido de direitos fundamentais e se consolida sempre mais uma economia mundial pautada em ganhos rápidos e exorbitantes. O resultado é uma consolidada “Cultura de Morte”. São inúmeras as condições que assinalam uma ampla cultura de morte hoje reinante na sociedade.  Condições geradas pelos sistemas econômicos globalizados injustos, os quais intensificam cada vez mais o utilitarismo da pessoa (exploração humana) para fins de lucros rápidos e fáceis e acentuam cada vez mais as diferenças sociais, a violência ideológica e religiosa, a carência de recursos naturais, tráfico, pobreza extrema, violência resultante da vida sexual desordenada e doentia (estupros, pedofilia, aborto ...). As guerras em diferentes regiões do mundo, que afetam a sociedade civil, deixando inúmeros mortos ou limitadas. A violência no campo da migração forçada. A degradação do meio ambiente é igualmente gerador de morte uma vez que há uma intensa inter-relação do ser humano com o ambiente, especialmente na área da saúde. Em todos os casos trata-se do desrespeito à dignidade humana.
São João Paulo II, em sua carta encíclica Redemptoris Missio (RM, 1990), em vista da realidade acima apresenta, elenca alguns importantes desafios dos novos areópagos da Evangelização, (RM n. 37):

"Paulo, depois de ter pregado em numerosos lugares, chega a Atenas e vai ao areópago, onde anuncia o Evangelho, usando uma linguagem adaptada e compreensível para aquele ambiente (Cf. At 17, 22-31). O areópago representava, então, o centro da cultura do douto povo ateniense, e hoje pode ser tomado como símbolo dos novos ambientes onde o Evangelho deve ser proclamado".

Ele elenca os novos areópagos, que são os espaços de evangelização e missão hoje: O mundo das comunicações; O empenho pela paz; O desenvolvimento e a libertação dos povos, sobretudo das minorias; A promoção da mulher e da criança; A proteção da natureza; O vasto mundo da cultura; A pesquisa científica.
Estas são as novas realidades da humanidade que merecem toda a atenção da Igreja, pois segundo a Constituição Apostólica Gaudium et Spes, do Concílio Vaticano II, (GS n. 1),

"as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração". 

Por isso, a necessidade de estar sempre, como propõe o mesmo Concílio, atentos aos sinais dos tempos. Sinais que revelam as realidades onde e como vivem as pessoas. Todo o gênero humano deve ser acolhido e estar no coração da Igreja.  No compendio da Doutrina Social da Igreja (DSI), a Igreja expõe todas estas novas realidades, considerando as interdependências das diferentes áreas e a resposta que a humanidade pode e deve esperar. São áreas distintas, mas que dizem respeito ao eixo central da Doutrina Social da Igreja (DSI n. 552): “A promoção da dignidade de toda pessoa, o bem mais precioso que o homem possui, é a tarefa essencial, antes, em certo sentido é «a tarefa central e unificadora do serviço que a Igreja, e nela os fiéis leigos, são chamados a prestar à família dos homens»”.  Na cultura do descartável (Cf. EG n. 53; CF 2015 n. 102ss), a dignidade do ser humano está continuamente ameaçada. Ganhos fáceis e rápidos estão no centro e o ser humano deve prestar a estes ou então pode ser lançado ao lixo. A própria Campanha da Fraternidade acaba sendo um sinal dos novos tempos, que contribui para que se promova a consciência cidadã, o diálogo, abertura às diferenças, entre outros.  
Os discípulos missionários, as comunidades cristãs, ultrapassam as suas próprias fronteiras e se tornam efetivamente ‘católicos’, ou seja, universais. Cabe a cada uma identificar os sinais dos tempos do seu ambiente mais próximo para o comprometimento com o Reino de Deus (EG n. 20): “Cada cristão e cada comunidade há de discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a aceitar esta chamada: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”.
O leque de espaços de evangelização não é só cada vez mais amplo, mas se tornou muito mais complexo. Não se pode falar sobre todos os espaços de evangelização, mas importa ressaltar alguns aspectos transversais a todas as realidades.  O modo da configuração socioeconômica resulta dos paradigmas reinantes nos diversos setores que a compõem. Estes se desenvolvem e disseminam a partir dos diversos saberes, de um lado benéficos e construtivos, de outro, muitas vezes conflitantes com a promoção e defesa da dignidade humana, portanto, também com os critérios do Evangelho. O empenho da Igreja em prol da dignidade da pessoa humana se intensifica e amplia cada vez mais. Para todas as áreas de presença e atividade humana, a pessoa e sua dignidade deve estar no centro. A este respeito, o texto-base da CF 2015 (CF n. 111) diz: “A Igreja, partindo de Jesus Cristo, propõe-se a servir, nesse contexto desafiador, com uma mensagem salvadora que cura feridas, ilumina e descortina um horizonte para além dessas realidades”.


Para cuidar da vida em todas as suas dimensões, a Igreja precisa marcar presença significativa em várias esferas da sociedade. O Card. Oscar Maradiaga (palestra 2014), referindo-se à importância da missão da Igreja no mundo, defende que “não devemos ser estrangeiros neste mundo”. Ele alertou para o pouco conhecimento dos membros da Igreja em questões de grande relevância na sociedade. A mesma preocupação os bispos da América Latina manifestaram na abordagem sobre os leigos (DAp n. 283):

"É urgente uma formação específica para que possam ter incidência significativa nos diferentes campos, sobretudo “no vasto mundo da política, da realidade social e da economia, como também da cultura, das ciências e das artes, da vida internacional, dos meios de comunicação e de outras realidades abertas à evangelização".


A resposta da Igreja para as questões da vida é sintetizada na expressão “Ecologia Humana”, a Cultura da Vida. Para a Igreja, o ser humano. São reflexões atualizadas do Concílio Vaticano II uma vez que hoje as interpelações ecológicas são mais contundentes e bastante confusas quando se trata da centralidade da problemática (DAp n. 126).  “A melhor forma de respeitar a natureza é promover uma ecologia humana aberta à transcendência que, respeitando a pessoa e a família, os ambientes e as cidades, segue a indicação paulina de recapitular as coisas em Cristo e de louvar com Ele ao Pai (cf. 1 Cor 3,21-23)”.  João Paulo segundo, na carta encíclica Centesimus Annus (CA), 1991, conclama todos os segmentos da sociedade para (CA n. 53) “salvaguardar as condições morais de uma autêntica ‘ecologia humana’”.  O caráter sagrado e inviolável da vida humana faz do cuidado da vida, a defesa da dignidade humana o centro da missão da Igreja. O Catecismo (CIC n. 588) diz; “A vida humana é sagrada porque desde sua origem ela encerra a ação criadora de Deus e permanece para sempre numa relação especial com o Criador, seu único fim”.
Os modernos areópagos (cf. CF 2015 n. 154ss), suas características próprias bem como suas interdependências, se encontram magistralmente expostos no Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 2004 (CDSI).  Justiça Social, Economia e Ecologia – o tripé da sustentabilidade – resume hoje o que de mais urgente e abrangente pode ser feito pelo bem da humanidade. De alguma forma estas dimensões se entrecruzam e tornam a contribuição da Igreja ainda mais desafiante. “A opção pelo ser humano e preferencialmente pelos pobres” (CF 2015 n. 161ss) requer atenção e cuidado também no âmbito da economia e ecologia.

Considerações finais


A CF 2015 oferece inúmeras possibilidades de engajamento pelo bem da pessoa e seu ambiente. Importa que se estabeleçam prioridades e se tenham objetivos bem claros o que se pretende nas comunidades de fé, nas comunidades de comunidades.
A proposta da CNBB por uma ampla reforma política pode e deve ser a contribuição conjunta da Igreja do Brasil.  Esta pode ser uma importante marca da contribuição que a Igreja deve e é capaz de oferecer a toda a sociedade. É hora de despojar-se de interesses e confortos pessoais e olhar para os desafios históricos e ao mesmo tempo aqueles bem próximos de cada discípulo missionário. Assim a Igreja como um todo pode se torna solidária, servidora e missionária.

REFERÊNCIAS

BENTO XVI. Deus caritas est. 2005. Disponível em: http://w2.vatican.va/content/benedict-xvi/pt/encyclicals/documents/hf_ben-xvi_enc_ 20051225_deus-caritas-est.html . Acesso em: 02 fev. 2015.

CONCILIO Vaticano II. Constituição Pastoral Gaudium et spes. Sobre a Igreja no
mundo contemporâneo, 22. In: VATICANO II. Mensagens, Discursos, Documentos.
Tradução Francisco Catão. 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2011.

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB). Texto-base da Campanha da Fraternidade 2015. Brasília: CNBB, 2015.

CONSELHO Episcopal Latino-Americano. (CELAM): Documento de Aparecida: texto conclusivo da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe: 13-31 de maio de 2007. 9. ed. São Paulo: Paulu, 2008.

JOÃO PAULO II. JOÃO PAULO II. Carta Encíclica Centesimus Annus, Disponível em:http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/encyclicals/documents/hf_jpii_enc _01051991_centesimus-annus_po.html. Acesso: 15 fev. 2015.

______Dives in Misericordia (Encíclica) 1980. Disponível em: http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_ 30111980 _ dives-in-misericordia.html. Acesso em: 25 fev 2015, conclusão.

_____Redemptoris Missio (Encíclica), 1990.Disponível em: http://w2.vatican.va/content/john-paul-ii/pt/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_07121990_redemptoris-missio.html. Acesso: 15 fev. 2015.

MARADIAGA, Card. Oscar. Giustizia distributiva e sviluppo integrale dell'uomo (palestra). Universitá Gregoriana, nov. 2014.

METTE, Norbert. Einführung in die katholische Praktische Theologie. Wissenschaftliche Buchgesellschaft, Darmstadt, 2005.

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium – A alegria do Evangelho. São Paulo (Documentos do Magistério): Paulus; Loyola, 2013.

______Mensagem para a Campanha da Fraternidade, 2015. Disponível em: http://www.cnbb.org.br/campanhas-1/fraternidade/15887-papa-francisco-envia-mensagem-para-campanha-da-fraternidade-2015. Acesso em: 25/02/2014.


PONTIFÍCIO Conselho “Justiça e Paz”. Compêndio da Doutrina Social da Igreja (2004). 2. ed. São Paulo: Paulinas, 2011.

13 de abr. de 2015

Pensando um pouco...

Temos coração no cérebro e cérebro no coração! Bem, nada de anormal, porque somos feitos de emoções e razões. E porque não conseguimos separá-las, é possível chegar a um dia como hoje, olhar para a mesma situação e ouvir percepções quase antagônicas. Cada um com seu olhar: Para quem precisa afirmar uma vitória, foi um sucesso, para quem precisa afirmar ser uma derrota, é um fracasso.... Com um pouco de autocrítica e objetividade, educação e sem manipulação ideológica, chegaríamos à conclusão que não há quem possa acusar 100% o outro e achar-se 100% correto. Nem todos os que fazem belos discursos sobre o respeito ao diferente, conseguem vivê-lo quando atinge como uma flecha as fibras do seus valores e convicções. Com uma pesca refinada de imagens e opiniões que sustentam nossas ideias pessoais ou para desmerecer a dos outros permite as pessoas se sobrepor aos demais, mas lembremos que não sem uma sutil ou descarada manipulação a nosso favor! E se identificamos falta de esclarecimento, de conhecimento, então não é desmerecendo a opinião do outro com a supervalorização de nosso pretenso conhecimento de causa (cada um tem muito a aprender) que resolve e, sim, nosso engajamento por uma educação da família, do Estado, enfim, de toda a sociedade, com mais qualidade. Então teremos um bom espaço para aplicarmos nosso tempo, nossas ideias, nosso conhecimento e tudo mais ...

4 de abr. de 2015

Páscoa - a celebração da vida!

Celebrar a vida, nesta Páscoa, comunhão com todos os nossos irmãos que de alguma forma entregaram sua vida ao Senhor: As vítimas da perseguição dos cristãos como o terrível evento numa universidade do Quênia, as vítimas da Germanwings e, nestes, grupos lembremos de todos ... Deus os tenha em sua glória e para nós fica a dura lição de cuidarmos melhor da vida humana e de todas as formas de vida, promovendo a paz e reconciliação! Páscoa é vida - requer, portanto, um engajamento contínuo e consistente em prol da vida no planeta!